segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

[Lançamento] Novo EP "Ciberpajé - Canúbis" traz 5 faixas psicodélicas & mágickas em parceria com o musicista goiano Fredé CF

CANÚBIS é o novo EP do Projeto musical Ciberpajé, ouça-o aqui. A obra traz 5 músicas que mixam a psicodelia experimental do Ciberpajé (Edgar Franco) e de Fredé CF, selando uma nova parceria de viés mágicko que promove a conexão dos universos ficcionais transmídia da Aurora Pós-humana e da MekHanTropia. Desta vez o Ciberpajé participou com vozes, aforismos e a arte e projeto gráfico do EP, e também gravando o berimbau de boca presente nas faixas. A arte teve inspiração mágicko-psiconáutica e resgata a figura de Anubis em um contexto pós-humanista.

Veja abaixo o encarte completo do EP, que pode ser ouvido em streaming e baixado na íntegra incluindo o encarte neste link.







Leia um inspirado texto de Fredé CF detalhando o processo criativo de CANÚBIS:

Acordei em uma madrugada de lua cheia, em meio a pandemia, com uma melodia em mente que me veio de um sonho. O relógio marcava 3:33. Nesse sonho eu estava em uma festa (ou ritual) ancestral, num templo em meio à natureza, com muitas plantas, animais e seres antropomórficos que me rondavam, dançavam e tocavam músicas calmas, porém intensas e viscerais. Tentei reproduzi-las usando violões (aço e nylon) e alguns sintetizadores e efeitos eletrônicos, para trazer uma ambientação mais onírico-psicodélica para as músicas, além de estéreos e contrastes entre o orgânico e o virtual, o ancestral e o futurista, o formal e o abstrato, a fantasia e a lucidez, tudo em constante movimento.

Transmutação. Metamorfose. Essa era a intenção. Essa É a intenção. Um encontro poético-filosófico transcendental entre a entidade do Cão Breu (presente como entidade fantástica em meu universo “MekHanTropia”) com Lobisomens Tecnogenéticos (da “Aurora Pós-Humana” de Edgar Franco), uivando juntos em pluriversos encantados projetados numa nova era transbinária que adentra as nuances da existência.

Batizamos então essa experiência sonora de “Canúbis”, como uma forma de representar esses encontros entre os universos artísticos que celebram a “conexão e o equilíbrio entre seres e espécies no planeta, em uma egrégora de elevação espiritual, até a extinção de nossa espécie egoica que liberará Gaia para novas experiências na explosão da vida”, como coloca o Ciberpajé na apresentação de seu álbum em quadrinhos intitulado “Renovaceno” (p. 05), muito utilizado aqui como referência.

O título também pode ser lido como referência etmológica ao Cão Breu, à Anúbis e à Cannabis, em uma hibridização conceitual experimental das três realidades (RVs) pensadas por Roy Ascott (2009)1 e utilizadas poeticamente em nossas reflexões: a Realidade Validada (humana, cotidiana, ordinária), a Realidade Virtual (dos fluxos maquínicos) e a Realidade Vegetal (ligada à natureza, ao transcendental e aos saberes magickos ancestrais de Gaia).

Tais encontros despertam reflexões sobre o momento de trevas e destruição planetária que passamos atualmente e tece relações com o autoconhecimento, as identidades, as subjetividades, a espiritualidade, os rituais e a psique representada por meio da arte. Ao pensar nesses conceitos relacionados a danças oníricas e psicoemocionais projetadas a uma dimensão desconhecida de renovação da vida, me lembrei também de alguns aforismos do Ciberpajé que nos convida pra sermos alegres e amorosos frente a vida a partir da experiência do “agora”, do “presente”, que traduz-se em “dádiva” pelo próprio nome. Talvez só assim possamos nos libertar das nostalgias ilusórias do passado e das ansiedades e (pre)ocupações sobre um futuro que ainda não existe. Quem sabe assim então possamos transformar a única coisa possível de ser profundamente modificado: nós mesmos no presente. Ao nos transformarmos, transformamos tudo e tudo se transforma a partir de nós, como mágicka no caos!

Dessa forma, compus as músicas, gravei e mixei os sons pelo celular e selecionei alguns aforismos do Ciberpajé, pedindo a ele para me enviar gravados e interpretados com sua voz. Pedi também que me enviasse alguns uivos transcendentais e experimentações com berimbau de boca para incluir nas faixas para a criação de atmosferas lúdicas e fantásticas. E então o EP foi surgindo como uma ode à alegria de viver e a amorosidade entre os seres e Gaia.

Buscamos a representação desses ciclos amalgamados da existência: a dança da vida que abarca sonhos subjetivos; os sonhos que transbordam a vida ao não serem mais sonhos; a vida caótica que perece e renasce em sonhos individuais e conjuntos transfigurados na caoticidade transcendental da realidade ordinária; transformação em arte dos sonhos que vivem e dançam em nossa tela mental particular cotidianamente pela imaginação.

Esses diálogos articulados, que transpassam as “realidades” ascottianas, em uma intersecção cósmica entre o meu universo e o do Ciberpajé, articula – por meio de sonhos, sons (acústicos e eletrônicos, ambos gravados, processados e editados pelo smartphone), máquinas, fluxos, pensamentos e palavras –, tais amálgamas.

Sobre o processo da criação das faixas:

As faixas/aforismos foram reunidas e nomeadas por temas afins que dialogassem entre si e, assim, tentei trabalhar as ambientações musicais com alguns contrastes entre sonoridades acústicas e eletrônicas se complementando, em uma busca de equilíbrio entre luz e sombras transcendentais. Busquei pensar em uma levada narrativa fluida em direção ao autoconhecimento e harmonia pelo caos, por meio do estranhamento pelo contato com contrastes, distorções, ruídos e dicotomias entre os elementos sonoros em confluência com as palavras recitadas do Ciberpajé.

Para os sons acústicos, utilizei 2 violões (um com cordas de nylon e outro com cordas de aço), chocalhos feitos de sementes seca, pandeiro, vocalizações, sibilos, batuques em alguns potes, panelas e vasos decorativos, vento na janela, e até o som de uma panela fervendo enquanto se cozinhava uma abóbora cabotiá (deliciosa, por sinal).

Para os sons eletrônicos utilizei dois apps com o iPhone 6: o Synth One e o Music Maker Jam. Tudo editado pelo aplicativo Hokusai 2, como foi feito com os discos “Cão Breu Pós-Humano”, “MekHanTropia”, “É esse mesmo o mundo que queremos?”, “Ecos Oníricos” e “Espelho de Obsidiana”. Recomenda-se a audição dessa obra em estéreo, pois favorece a imersão em suas imbricadas psicodelias oníricas que trafegam, transmutam e conectam as faixas dentro do conceito holístico e astral do EP.

Na última faixa, “Inner Beast Escape (Ritual Transbinário)”, usei trechos cantados do ritual para honrar e guiar os mortos com a entidade egípcia Anúbis (ou Anpu), presentes nas páginas 165-169 do livro “Werewolf Magick”, de Denny Sargent (2020). Recitei também, como backing vocals por todo o andamento da música, os dígitos 0 e 1 que compõe a narrativa da HQ “Renovaceno” do Ciberpajé (“Introito: Transbinários”, p. 09-14), além de também declamar alguns aforismos e trechos filosóficos relacionados às p. 16, 57, 62 e 63 do álbum em questão. O Ciberpajé uivou durante toda a faixa.

Harmonizei com uns efeitos psicodélicos de sintetizadores, violões, programações, loops e vocalizações e a música ficou com 6 minutos caracterizados pela constante mudança de atmosferas, representando assim uma ideia de caos e inconstância, ideias bastante expostas pelos universos artísticos autorais de “MekHanTropia” e da “Aurora Pós-Humana”. A instabilidade da existência por meio de sons e imagens que instigam o que há de misterioso, prazeroso e inexorável na vida: o movimento, a transformação e a implacável diversão genuína.

Evocamos a abertura das perspectivas para devaneios e movimentações de desconstrução de padrões ordinários e, a partir de si mesmo, do olhar antropoceno em direção ao infinito caótico da existência, que se renova em novas cosmogonias. Existência essa que só de fato existe no agora presente em momentos de paixão, absorvidos e intensificados pelo deleite da fruição artística e da vida em movimento contínuo, puro, metamórfico. Um fluxo expurgante, uivante, delirante, infantil, expansivo e sinuoso de integração com o todo, essencial trajeto para, enfim, saltarmos de ponta no caos inexorável e nadarmos no nada de uma vida indomada, selvagem e serena.

Infinada. Enfim, nada. O nada que tudo absorve. O nada que tudo é e em tudo está. O nada (des)transfigurado pelas redes telemáticas em “zeros” e “uns” hipnotizantes e desconectados da essência hipertecnológica da arte e do habitat. Dígitos ilusórios cada vez mais distantes de Gaia. Expurgados da vida e do pulsar integrativo de nossos movimentos essenciais. Cuspidos do autoconhecimento transbinário, que trafega pelas zonas cinzas que o digital insiste em aniquilar com padronizações MekHanTrópicas destruidoras de subjetividades. A arte como instrumento capaz de trazer de volta momentos sinceros, únicos, qualificados, qualitativos, materializados, aproveitados com intensidade rica, alegre e visionária, no prazer vivo da carne, da aura, do espírito, da potência, da vontade, dos sentidos que tocam e são tocados transitando poeticamente a partir das memórias e da imaginação pelas entranhas do analógico e do digital.

No agora, na essência, na pausa, no que há de fato, escapamos da mesmerização da existência. Pela arte, pela vida, pelo amor, pelo existir e insistir no mundo que trazemos em cada um de nós. Por nos deixar conectar e desabrochar um ritual cósmico entre personagens de diferentes dimensões que se conectam enquanto meios de expurgar o mal que assola o planeta a partir de cada um. Através do sentir, identificar e acolher as Sombras, se transmutando profundamente em Lobisomens pós-humanos, em Cães Breus mekHanTrópicos e em Anúbis, entidade que emerge como guia da obra e acessa, na alma, uma intrínseca animalidade ancestral, transcendental, renovada. Surpreendentemente brincando, uivando, se divertindo e (Re)Existindo na resistência por meio da arte D.I.Y. a um instituído sistema seco, careta e sem vida!


1ASCOTT, Roy. Existe amor no abraço telemático? In. Arte, Ciência e Tecnologia: passado, presente e desafios, Diana Domingues (Org.), São Paulo: Editora Unesp, 2009.

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