terça-feira, 14 de maio de 2019

[Resenha] EP Ciberpajé - Encanto da Terra fez-me sentir mais humana e, sobretudo, mais animal! Por IV Sacerdotisa Danielle Barros



Gostaria de iniciar falando sobre os aforismos, que trazem em essência a mensagem da oposição complementar: luminosidade que surge da escuridão; fim e recomeço; dor e revolução interior; tempestade e calmaria; êxtase e sofrimento. Ao contrário dos EPs anteriores em que os aforismos são recitados, neste EP Encanto da Terra eles tem um ritmo, que em certos momentos flui harmonicamente com os sons da natureza, e em outros, destoa, e incomoda. Em todas as faixas, os aforismos ecoavam como mantra em minha mente.

 A arte da capa e suas cores ficaram lindas! A simbologia do guardião em simetria, cuidando do ovo ao centro, que olhando mais de longe, parece ser a pupila do olho de Gaia. O ovo cósmico que simboliza a vida e criação. As cores predominantes azul e roxa, proporcionam uma sensação de paz, serenidade e transcendência espiritual. 

Clique na capa do EP "Encanto da Terra" para ouvi-lo na íntegra


A proposta de Genilson (Puro) e do Ciberpajé neste projeto em focar nos sons da natureza e nas vozes em melodia proporcionam uma experiência diferente e estranha, por outro lado, essa estranheza que senti só confirma a ousadia e o experimentalismo que a dupla sempre nos desafia a fruir em suas criações. O Aforismo I começa com sons de pássaros, floresta, com a melodia do aforismo com voz incômoda e monstruosa seguida de um silêncio de profunda paz, que se segue de um entoar que remete a um cântico ancestral. O Aforismo II trouxe-me uma lembrança de infância, de um ritmado de filme de terror com um final selvagem e bizarro. Já no Aforismo III, a melodia fluiu perfeitamente com o som da natureza e o mantra da tempestade persistiu na minha mente o dia todo.

Só uma criação autoral e despretensiosa em relação ao que o público espera usa sons de grilos e de uma pessoa arfando para abrir um EP. A mim soou como uma simbologia de animalidade que abre os sentidos de quem está ouvindo, provocando outros sentidos, como o da iminência da fuga ou a de incitar a animalidade do ouvinte. Uma das coisas mais ricas que percebo quando me deparo com uma criação do Ciberpajé e de Genilson (Puro) é saber que, em cada obra, eles brincam e experimentam, utilizam os sons de formas distintas, inovam nos conceitos e simplesmente se divertem criando. 

Em tempos de degradação da natureza e de extinção das espécies a passos largos, poder desfrutar deste EP Encanto da Terra, fez-me sentir mais humana e, sobretudo, mais animal. Um animal que é parte de tudo, que cria e vivencia a arte autêntica, a arte livre! Parabéns aos criadores por mais este EP!

*IV Sacerdotisa Danielle Barros - é artista multimídia, doutora em arte/ciência e educação pela Fiocruz/RJ e professora da UFSB, em Teixeira de Freitas (BA).

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