ECOS HUMANOS :
Ciclos de Amor/Vida & Destruição/Morte
por Julie
"Camila GLS Rock Zine" Albuquerque*
Preâmbulo
Sábado, 25 de Agosto de 2018.
Acordo de madrugada. Faz frio e está chovendo. Isso me preocupa
porque pretendo ir pra São Paulo. E como moro na zona rural, num
sítio localizado a 25 km da cidade - leia-se
Ibiúna-City, interior de São Paulo-SP -, não me agrada ou anima o
fato de eu ter que encarar 5 km a pé amassando barro numa estrada
de terra pra pegar um ônibus com destino ao centro de minha cidade.
:-\ Felizmente bem de manhã quando saio de casa já não está mais
chovendo e a estrada não está tão enlameada quanto imaginei que
estaria. Na verdade ela ficou lavada, isso sim.
Julie na UGRA com seu zine Camila e o exemplar da revista Artlectos & Pós-humanos#1 que levou para o Ciberpajé autografar
Pego
o busão pra Ibiúna-City, desço no meio do caminho (leia-se
Furnas), e pego outro busão, desta vez um intermunicipal com destino
a Cotia. No terminal Cotia pego um ônibus rodoviário até a
Estação/Terminal Barra Funda - de onde pego o metrô e vou pra tudo
quanto é canto de Sampa. E esse meu trajeto leva em média umas
4 horas. Sem contar que também tem um cu$to alto,
principalmente para alguém como eu que não tem trabalho e nem
salário fixos. Tanto que por conta disso, só vou pra Sampa poucas
vezes e quando dá mesmo. :-( Desço na Estação República e
vou até a famosa Galeria
do Rock - onde dou um
passeio solitário apenas olhando pras lojas e seus produtos.
Encontro um lugar tranquilo e sossegado pra me sentar no último
andar - que tem menos movimento. Fico ouvindo música (mp3 no
celular), enquanto espero dar a hora combinada para encontrar-me com a minha queridíssima Evy.
♥
Nas
primeiras horas da tarde - logo após eu ter de recusar um convite de
duas garotas estudantes de alguma Faculdade, para eu participar de um documentário -, um pouco antes do combinado, a Evy
já aparece pra minha surpresa. =^.^= Damos um passeio pela
Galeria do Rock,
tiramos as nossas primeiras selfies/fotos. Em seguida a Evy
me leva pra um fastfood (Mcâncer Feliz), e como sou uma pessoa
ovolactovegetariana, fico só nas batatinhas mesmo. ;-p
E
como eu tirei o dia pra esse meu (primeiro) encontro
(oficial/marcado) com a Evy,
digo-lhe que farei e seguirei qualquer plano/roteiro ao qual ela
desejar, pois pra mim o que realmente importa é estar junto a ela. ♥ A única coisa que peço a Evy,
é que ela me acompanhe numa breve e rápida visitinha na loja UGRA
do meu casal de amigos Dani
& Douglas Utescher,
no final da tarde. A UGRA
é uma loja/livraria especializada em quadrinhos
autorais/independentes/alternativos & contracultura, mas também
com espaço para zines & fanzines, livros, box dvds de filmes &
seriados de horror/terror & FC (Ficção Científica),
camisetas. Ou seja, só tem coisas que gosto e aprecio e quero
MUITO adquirir. *~* Na UGRA tu não encontra coisas manjadas como
o Super-Homem, Batman, X-Men, Homem-Aranha, Homem de Ferro, Thor,
Vingadores e similares pasteurizados & americanizados ou mangás
modinha. E é esse o seu diferencial que tanto me atrai. U.U
Depois do fastfood (c/ direito a
unicórniozinho de brinde com chifrinho que brilha pra coleção da
Evy), ela e eu vamos pro metrô República, onde tiramos mais fotos/selfies com
os emoticons gigantes (que também tinha alguns na Galeria
do Rock), e de lá fomos
até o metrô Consolação para chegarmos na UGRA,
que está localizada na Rua Augusta, 1371, loja 116, Consolação,
São Paulo-SP. E é sempre bom e maravilhoso ver o casal de amigos
Dani & Douglas
e visitar a loja deles. A Evy
e eu temos uma ótima recepção de ambos na loja. ^-^
E
o motivo de eu querer muito passar ali na
UGRA não era à toa ou
por acaso. Na UGRA,
todo sábado tem algum lançamento e tarde de autógrafos, e eu já
sabia através do fakebook, que um artista que acompanho já faz um
tempo e admiro muito estaria ali presente. Trata-se do talentosíssimo
multi-artista transmídia Ciberpajé
(Edgar Franco).
E neste dia em questão ele estava como roteirista e co-autor do
álbum ECOS
HUMANOS (2018,
Editora Reverso), juntamente com o quadrinista Eder
Santos.
Além de pobre, já que praticamente a Evy
era quem tava me bancando nesse nosso encontro/rolêzinho em Sampa,
eu também sou bem cara-de-pau. Tanto que tive a ousadia/audácia de
dizer aos mencionados autores que não tinha grana pra comprar o
álbum deles, mas que mesmo assim queria pelo menos um autógrafo do
Ciberpajé
numa publicação antiga e mais barata que eu já tinha dele. Pois
tirando as HQ's curtas de sua autoria em algumas edições do fanzine
"MULTIPLO"
do André
Carim, eu só tenho
mesmo a revista independente ARTLECTOS
E PÓS-HUMANOS # 1 de 2006, lançado pela SM
Editora (que agora é a
Editora Júpiter II)
de José Salles.
Julie com a revista Artlectos & Pós-humanos#1 autografada pelo Ciberpajé
Ciberpajé,
Eder Santos,
e Guilherme Silveira, são mega agradáveis e super legais comigo e me tratam muito
bem, mesmo eu não podendo comprar e adquirir o material deles. E o
Ciberpajé
aceita e topa de bom agrado autografar a revista dele que eu tinha.
Distribuo pras pessoas presentes um (queer)zine de minha autoria, o
CAMILA ZINE -
EDIÇÃO ESPECIAL DE 10 ANOS!,
incluindo os artistas/autores da mesa de autógrafos, que
ironicamente pra minha surpresa me pedem pra que eu assine as cópias
deles do meu (queer)zine. 0.0
Mas
o mais foda é que o Ciberpajé
se sensibiliza com a minha situação e minha admiração por suas
várias vertentes multi-artísticas transmídia, como por exemplo a
sua banda performática POSTHUMAN
TANTRA, a
qual menciono, e daí ele me surpreende mais uma vez e me presenteia
com o magnífico álbum ECOS
HUMANOS! E
ainda com direito a autógrafo/dedicatória/sketch dos autores!!! =o
Cara, isso foi fodaralho!!! Algo incrivelmente sensacional e que me
deixou feliz pra k-7! A atenção, o respeito, a humildade e o gesto
e atitude do Ciberpajé
só fez aumentar minha admiração por sua pessoa! E conhecer pessoas
assim é que é o verdadeiro presente que a vida e o universo pode
nos proporcionar! *^-^*
O Ciberpajé e Eder Santos no lançamento de Ecos Humanos na Ugra (SP)
O
Ciberpajé também distribui um microzine O Que São HQforismos?,
feito por Danielle Barros
(IV Sacerdotisa).
E além deste microzine e do meu (queer)zine, também é distribuído
entre as pessoas presentes ali na UGRA, um prólogo/amostra de um
projeto/HQ (Histórias em Quadrinhos) intitulado Veludo
dos 9 Infernos (com roteiro de Lula
Carneiro & Bruno Brunelli
- que também é responsável pelos desenhos. Baseado numa história
real psicografada por Nivio
Domingues). Algumas
fotos da gente (Ciberpajé, Evy & eu) são tiradas.
O Ciberpajé e Julie Albuquerque no lançamento na Ugra(SP)
Resenhando Ecos Humanos
(Contém Spoilers)
O
álbum ECOS
HUMANOS (2018,
Editora Reverso)
tem 72 páginas em P&B com papel de excelente qualidade, capa
dura cartonada em cores com orelhas contendo uma auto-caricatura &
minibiografia resumida de cada autor (Ciberpajé
- roteiro & Eder
Santos - desenhos), num
formato grande e agradável. As artes em cores na capa e contracapa são
belas e de extremo bom gosto. A HQ deste maravilhoso álbum está
dividida em 4 partes ou capítulos, e como ela é uma narrativa
gráfica/visual sem textos, recordatórios, balões de fala ou
qualquer palavra, cada parte/capítulo em vez de ter um título
escrito, tem uma ilustração no inconfundível traço do Ciberpajé.
Devo confessar que até então não conhecia o talentosíssimo
quadrinista Eder Santos,
cuja sua arte em P&B me impressionou e fascinou bastante pelo seu
rico traço cheio de detalhes e efeitos de luz & sombra, assim
como o uso da técnica de hachuras, que somados dão vida e emoção
ao seu majestoso trabalho gráfico. E como esta obra é em P&B,
podemos observar e analisar com nitidez e clareza, o quão bom é o
traço e arte do desenhista & quadrinista Eder
Santos, já que não há
cores ou efeitos de computadores para 'disfarçar' algum erro ou
imperfeição sua.
Autógrafos dos autores no exemplar de Julie Albuquerque
E "sem palavras pro roteiro desta HQ muda" feita pelo já renomado e
conceituadíssimo multi-artista transmídia, o Ciberpajé
(Edgar Franco).
E sim, este trocadilho foi infame, algo mais forte do que eu e que
não pude evitar de fazer! XD Mas é justamente este o ponto
mais alto e forte deste álbum, cujo o encanto e magia está no fato
dele ser uma obra visual com narrativa muda, que por conta disso,
pode ser apreciado e interpretado de acordo com a visão, análise e
sentimento de cada leitor(a) em particular. Cada pessoa terá uma
interpretação única, intimista e pessoal desta fabulosa
arte/narrativa gráfica. E não é só isso apenas, ainda há o lance
dessa espetacular obra não enfrentar obstáculos e barreiras
culturais, já que por não possuir textos/palavras, nada o impede
que qualquer pessoa de qualquer canto do mundo possa apreciá-lo e
absorver o encanto/magia nele contido! O cinema perdeu este poder e
encanto/magia quando passou a ser falado, assim como quando as
músicas passaram a ter videoclipes. O encanto/magia está no fato
de você poder sentir e interpretar determinada arte, seja ela o
cinema, a música, os quadrinhos ou qualquer outra forma de expressão
artística. Neste ponto e quesito, o roteirista Ciberpajé
acertou em cheio a escolha de fazer uma obra muda, onde ele pôde colocar todo seu poder e influência transcendental xamânica, que foi
absorvida pelo desenhista Eder
Santos, ao consequentemente transpor isso para a sua arte - que por sua vez
atingirá cada leitor(a) de um jeito mágico único e exclusivo,
dependendo do nível de percepção que cada um possui!
Na
primeira parte/capítulo da HQ começamos com uma visão do espaço
para Gaia - a mãe-terra, e já podemos notar que ela já não é a
mesma deste nosso atual tempo. E a partir daí temos um zoom que vai
indo até algum ponto da América do Sul, que acaba se mostrando um
pequeno oásis no meio de um deserto inóspito. Nesse pequeno oásis
há apenas uma pequena fonte de água doce/potável e três árvores
frutíferas. E ilhados neste oásis somos apresentados aos
personagens principais desta HQ, que são dois seres humanoides totêmicos híbridos de humanos e lobos-guará. Ambos usam roupas
sujas e rasgadas, porém apropriadas para se sobreviver no deserto, e
também cada um está munido por seu cajado de madeira. O que distingue um
do outro fora a aparente diferença de idade, é que o xamã jovem
carrega no pescoço um estilingue, e o xamã velho além de usar
brincos, também usa um colar rústico contendo quatro símbolos; o
"$" representando o dinheiro/poder, uma "lua"
talvez representando a bruxaria (Wicca)
ou simplesmente as suas fases e efeitos na terra, a "Estrela de
Davi" que tanto pode representar o judaísmo ou seu antigo
significado pagão para o sagrado masculino & sagrado feminino, e
por último uma "cruz" que representa o cristianismo ou
catolicismo, mas que para mim representa/simboliza
tortura-dor-sofrimento-morte. Esta primeira parte/capítulo serve
como uma introdução e apresentação dos personagens, o cenário em
que vivem e como vivem o seu dia a dia. Se alimentando dos frutos das
árvores, saciando a sede bebendo da fonte, e se protegendo das
tempestades de areia agarrados fortemente a uma das três árvores. O
xamã jovem aparenta estar feliz e satisfeito com este estilo de vida
simples, o que não é visto no xamã velho, pois fica nítido e
óbvio a sua angústia/descontentamento/insatisfação/tristeza. E
fica claramente visível nestas primeiras páginas desta HQ, que ela
é ambientada num futuro pós-humano em um universo poético-ficcional
criado pelo Ciberpajé
já há alguns anos e que ele batizou de Aurora
Pós-humana. E
que a história desta HQ se passa bem depois da história contida no
já clássico álbum BioCyberdrama Saga, parceria do
Ciberpajé
com o mais que renomado/conceituado/consagrado desenhista Mozart
Couto! No final dessa
parte/capítulo da HQ, o sério xamã velho mostra com os dedos de
sua mão híbrida que faltam 9 alguma coisa. Seria 9 anos, meses,
semanas, dias ou horas? E para o que acontecer??? O xamã jovem
demonstra apreensão…
O Ciberpajé, Julie e Eder Santos no lançamento na Ugra
Na
segunda parte/capítulo da HQ, aparentemente o xamã velho está
adoecido e deitado sob o pé de uma das três árvores. Sentado
próximo a ele está o xamã jovem que dá um grito de tristeza/raiva
ao infinito por causa desta situação. Nisso, no céu surge um
tucano que se dirige para uma das três árvores e começa a se
alimentar dos frutos. O xamã jovem desperta e avisa o xamã velho do
surgimento da ave. O xamã velho fica surpreso, mas já em seguida
pede o estilingue do xamã jovem - que se recusa a entregá-lo,
achando essa atitude de querer abater o tucano errada. Mas o teimoso
xamã velho não está nem aí pra isso e tira contra a vontade do
xamã jovem o seu estilingue. Pega uma pedra e abate o pobre coitado
do tucano - que acaba virando uma refeição. O xamã velho oferece
metade da carne do tucano para o xamã jovem - mas este se demonstra
bravo/revoltado/indignado e se recusa a comer da carne do tucano
abatido. Então sem cerimônia ou remorso, o xamã velho devora
sozinho toda a carne do tucano, pois pelo visto, apenas o xamã jovem
está satisfeito com sua dieta vegetariana... No outro dia, o xamã
velho faz um colar com o bico do tucano e algumas de suas penas
pretas e o oferece de presente pro xamã jovem - que o recusa de
imediato e de mau humor. Daí também mal humorado, o xamã velho
pega pra si mesmo o dito colar, passando a usá-lo sob o
outro colar já descrito antes.
Passado
um certo tempo e com a dieta vegetariana novamente, comendo apenas
dos frutos das três árvores, eis que uma arara é avistada numa
delas se alimentando. E pra decepção e frustração do xamã jovem,
o mesmo destino do tucano é aplicado para a arara. Só que desta vez
ele aceita comer a metade da carne da pobre ave abatida. Mas ele o
faz chorando, cheio de pena e remorso de tal ato...Provavelmente alguns dias depois,
vemos o xamã jovem angustiado e pensativo, sentado sob o pé de uma
das três árvores, e nos surpreendendo mais uma vez, já que está
usando um colar feito com o bico da arara e algumas de suas verdes
penas. Nisso, enquanto passa um vento derrubando algumas folhas das
três árvores, logo atrás da árvore ao qual o xamã jovem está
encostado, de pé e com o cajado na mão esquerda, o xamã velho
velho avista um ser humanoide no deserto vindo na direção deles. O
xamã velho avisa o mais jovem apontando com o dedo da mão híbrida
direita na direção do ser humanoide ao qual avistou. Tanto o xamã
jovem quanto o mais velho ficam surpresos pela criatura humanoide ser uma híbrido de uma mulher com uma onça pintada. Trajando poucas
vestes e com os seios expostos, a mulher-onça tem um olhar
de súplica, mostrando nele e nos trejeitos um ar de desespero e de
quem precisa de alguma ajuda, e sem demonstrar nenhum tipo de
maldade, falsidade ou ameaça. A mulher-onça fica com a mão e braço
direito estendidos na direção dos dois companheiros xamãs,
esperando por uma ajuda e/ou resposta deles. Mas ambos os xamãs se
entreolham com cara de dúvida de como devem proceder a tal súplica.
E eis que repentinamente, do nada, o xamã velho ataca a mulher-onça
com o seu cajado, perfurando em meio ao seu peito e a atravessando
nas costas. A mulher-onça morre nos braços do xamã velho - que em
seguida deita o seu corpo no chão gramado próximo da fonte. O xamã
jovem se aproxima e se agacha próximo do corpo ensanguentado da
desfalecida mulher-onça. Põe as duas mãos na cabeça e grita
desesperado lamentando profundamente a morte da mulher-onça,
enquanto o xamã velho fica calado apenas observando. No fim das contas, a mulher-onça acabou também virando apenas mais
um banquete para os dois xamãs exilados neste pequeno oásis em meio
ao deserto inóspito...
Na
terceira parte/capítulo da HQ, vemos os dois xamãs com cara de
desânimo. Eles se entreolham, uivam pro céu, se entreolham de novo,
mas desta vez com ambos sorrindo - provavelmente em gratidão a uma
das três árvores que ainda está com frutos para alimentá-los e
saciar sua fome. Só que em determinado momento, o xamã jovem
avista os primeiros sinais de uma forte tempestade de areia que se
aproxima. Seu olhar é pura apreensão e preocupação. Apontando
para o horizonte, ele grita alertando o xamã mais velho do perigo
iminente, e depois corre na sua direção. Os dois xamãs tentam se
proteger da forte tempestade de areia da melhor maneira que podem
agarrados a uma das três árvores. Desta vez os danos são
irreversíveis. As folhagens e os frutos das três árvores são
arrancadas pelo forte vento da impiedosa tempestade de areia, assim
como os colares do tucano e da arara e também o cajado do xamã
mais velho, que são perdidos para sempre. Sobrevivendo à tempestade, os dois xamãs agora observam apenas três árvores secas
e sem nenhum fruto para lhes saciar a fome. Só restou-lhes mesmo a
pequena fonte de água doce - na qual o xamã jovem sacia sua sede e
carrega nas mãos um pouco d'água pro velho xamã, que está
doente/fraco/abatido. Encostado numa das agora três árvores secas,
o xamã velho apenas recebe e bebe um pouco d'água que o seu
companheiro mais jovem lhe traz nas mãos. E mesmo abatido, o xamã
velho orienta o xamã jovem a regar (assim do mesmo jeito com as
mãos) as três árvores secas, para que elas voltem logo a dar mais
frutos. O xamã velho sabe que está morrendo e não esconde isso em
seu olhar desalentado enquanto dirige suas últimas palavras e/ou
ensinamentos ao seu pupilo, o xamã jovem. Pouco depois, o xamã
velho fica imóvel e em silêncio. O xamã jovem sacode o seu mestre
e companheiro mais velho tentando acordá-lo ou fazê-lo reagir de
algum modo. Mas essa sua atitude é em vão. O xamã velho está
morto. Uma tristeza forte, profunda e aguda recai sobre o xamã
jovem, que em pura angústia, penosamente lamenta e chora pela morte
e perda de seu mentor e único companheiro que tinha no confinado
isolamento do mundo naquele pequeno oásis. E como recordação ou um
tipo de herança, o xamã jovem se apossa do colar do xamã velho,
aquele com quatro símbolos (cruz, estrela de Davi, lua, cifrão). O
xamã jovem senta-se do lado do corpo do xamã velho - deitando-o sob
seu colo. E assim desse modo, se sentindo totalmente só e com os
sentimentos mais tristes possíveis, o xamã jovem se despede do xamã
velho, olhando para o seu corpo morto/desfalecido deitado em seu
colo.
Algum tempo depois, já de noite e
com uma lua cheia, vemos o xamã jovem se alimentando com a carne da
parte do lado esquerdo do rosto do cadáver do xamã velho. E ele faz
isso com lágrimas nos olhos. Repudiando a si mesmo e esse ato
hediondo de canibalismo. Mas ele só o faz porque tem consciência de
que essa é infelizmente a única maneira possível dele resistir e
continuar vivo, já que não há mais frutos nas três árvores que
agora estão secas... (Nota: Nos dois closes do rosto do
cadáver do xamã velho, vemos que é a parte direita dele que está
sendo devorada, mas no plano maior e mais aberto vemos o oposto. Ou
seja, um pequeno erro de continuidade apenas, e que não interfere
drasticamente ou descaracteriza de modo algum a obra.).
Na
quarta e última parte/capítulo desta HQ, logo de cara vemos que do
xamã velho só restaram os seus ossos, e que consequentemente já se
passou um bom tempo desde os ocorridos da parte/capítulo anterior.
Angustiado. Triste. Pensativo e reflexivo. Vemos o xamã jovem - recostado e sentado sob uma das agora três árvores secas - observando o crânio do xamã velho que ele segura em sua mão
direita. Ele continua a beber e saciar sua sede na pequena fonte
d'água, e também continua regando com as próprias mãos, as três
árvores secas. E no final de mais um entardecer, o xamã jovem
observa o pôr-do-sol com uma cara totalmente triste e desolada. E
com total desânimo e sem nenhuma esperança de sobreviver por muito
tempo - já que agora não há nada mesmo com o que possa se
alimentar e saciar a sua fome -, ele adormece deitado sob o pé de
uma das três árvores secas, segurando para si com a mão direita, o
crânio do seu amigo, mentor e ainda companheiro de certa forma, o
xamã velho.
No
dia seguinte, o xamã jovem acorda e a primeira coisa que ele avista
são os cogumelos que brotaram aos pés das árvores secas, exceto a na qual dormiu bem próximo. Ele pega um punhado de cogumelos,
cheira-os e sem pensar muito, e também por falta de opção melhor,
faz o seu desjejum comendo-os. Após comer uma boa
quantidade de cogumelos, o xamã jovem passa a se sentir mal com uma
tontura e dor de cabeça. Ele se senta e recosta-se numa das três
árvores secas e fica totalmente brisado, passando a ter alucinações. As três árvores secas, assim como toda paisagem e cenário ganham
formas psicodélicas. E a primeira brisa/alucinação é que o colar
com os quatro símbolos ficou espinhoso. Daí ele o retira
rapidamente de seu pescoço e o joga ao chão. O colar se transforma
numa cobra - que enfia sua cabeça no chão, abrindo um buraco na
terra e desaparecendo nela. Depois disso, no céu surge um bando de
araras - em cujo pés carregam algum tipo de fruto que jogam para o
xamã jovem, que se alimenta deles caindo diretamente em sua boca. Em
seguida, o xamã jovem fica com uma cara animada e contente após
avistar uma mulher-onça - parecida com aquela que ele viu da outra
vez -, que vem caminhando em sua direção. Ao se aproximar do xamã
jovem, vemos que a mulher-onça está carregando nos braços um
bebê-filhote - que está sendo amamentando pelo seu seio esquerdo. A
mulher-onça oferece o seu seio direito ao jovem xamã - que
respeitosamente aceita e bebe de seu leite. O xamã jovem fica
contente e sorri feliz com direito a carinho/cafuné em sua cabeça
pela mão direita da mulher-onça - que também lhe retribui com um
sorriso mais discreto. Depois disso, a mulher-onça e o seu
bebê-filhote se transformam em suas formas animais. Ela ruge de
forma ameaçadora, e em seguida encara o xamã jovem, enquanto que o
filhote apenas fica observando. O xamã jovem não demonstra medo e
nem reage, mostrando uma cara serena e tranquila. Então nisso, a
agora onça e seu filhote saem correndo. Mas antes de desaparecer
correndo pelo deserto, ela dá uma última olhada para trás para o
jovem xamã - que fica apenas observando e demonstrando uma paz de
espírito dentro de si. Mas repentinamente algo chama à atenção do
xamã jovem - que fica assustado/apavorado/desesperado com a imagem
das três árvores secas que começam a derreter e se diluir no chão.
Ele até tenta em vão segurar com as mãos uma delas, porém tal ato
é inútil. Derrotado, o xamã jovem fica sentado no chão ao lado do
crânio do xamã velho e expressando aquela cara e olhar de
desolação. Então ele pega o crânio do xamã velho e em seguida já
leva um baita susto, pois do chão surge/emerge um tucano que vai pra
cima dele e lhe rouba o crânio, para depois sumir no céu do
horizonte com o artefato mórbido roubado. O xamã jovem apenas grita
desesperado pela sua nova perda e depois fica só olhando até o
tucano desaparecer de vista. Então ele fecha os olhos e adormece...
Quando o xamã jovem desperta, já
não está mais sob os efeitos alucinógenos derivados do consumo dos
cogumelos que comeu. Ele percebe que continua no mesmo lugar, sentado
e recostado numa das três árvores secas e segurando com a mão
direita o crânio do xamã velho. E ainda assustado com as
brisas/alucinações que acabou de ter, ele arremessa longe o crânio
que se estilhaça em várias partes ao cair/bater no chão. Daí ele
também percebe que ainda está com aquele colar com os quatro
símbolos - que ele também arremessa ao longe, pois agora ele o
repudia com uma intensidade imensa, apenas mantendo o estilingue em
seu pescoço como era antes. Ele se levanta e começa a caminhar em
direção ao deserto inóspito de forma determinada e abandona o
pequeno oásis onde permaneceu por muito tempo até o atual momento.
E após caminhar bastante pelo deserto inóspito, o xamã jovem para
de forma repentina ao ficar chocado com alguma visão perturbadora.
Ao ponto dele gritar em total desespero e com lágrimas escorrendo
por seu rosto. E após desabafar com seu grito desesperador, ele
continua a chorar, dá mais alguns passos adiante e para bem próximo
de um alto abismo. E deste lugar (com uma bela borboleta voando
próximo), o xamã jovem tem a infelicidade de contemplar uma
paisagem desoladora - ao qual também se vê o que sobrou da imensa
estátua de um 'Cristo Redentor'...
E
assim termina essa fantástica e sensacional HQ, concebida
magistralmente pelo roteiro espetacular do Ciberpajé
e fabulosa arte de Eder
Santos. O final
revelador e impactante me remete há uma inevitável comparação com
o mega cult do cinema de FC, o sensacional filme O Planeta dos Macacos (1968). Claro que esta é uma visão e interpretação muito pessoal
de minha parte desta magnífica obra. Outras pessoas que se depararem
com esta obra terão os seus próprios sentimentos, visões e
interpretações pessoais diferentes das que descrevi. E é assim que
ela deve ser! Uma ato mágico, único e exclusivo para cada um que
tiver acesso a esta maravilhosa HQ!
O
álbum ECOS
HUMANOS também
traz como extras um posfácio escrito por Rubens
César Baquião, e um
making of com estudos e layouts. Em suma, um álbum mais do que
recomendadíssimo! Principalmente por duas escolhas certeiras
fundamentais/essenciais que o Ciberpajé
fez. A primeira foi a escolha da HQ ser muda. Já a segunda foi a
escolha do desenhista Eder
Santos para fazer a arte
em cima de seu roteiro. O Ciberpajé
podia muito bem ter feito/produzido/concebido este álbum sozinho, já
que ele é um artista transmídia competente e de sucesso, além de
ser um renomado e conceituado quadrinista, dono de um traço/estilo
único e inconfundível. Ele também é um dos pioneiros do gênero
quadrinhos
poéticos-filosóficos, que é genuinamente um estilo 100% brasileiro/nacional de se produzir
HQ's. E mesmo assim, com todo esse currículo e gabarito, ele
preferiu ficar só no roteiro, como em alguns outros projetos e
parcerias. Parabéns ao Ciberpajé
por sua humildade (tanto profissional como pessoal), e por suas
sábias e sensatas escolhas, que só enriquecem os seus
trabalhos/projetos artísticos, presenteando da melhor forma possível
os seus fãs e admiradores com obras mágicas/únicas/sensacionais,
como este maravilhoso álbum ECOS
HUMANOS!
Epílogo
Depois da UGRA,
a Evy
eu vamos pro metrô novamente com destino a 'Liba'
(Liberdade - famoso bairro oriental de São Paulo-SP). Na Liba,
logo de cara nos deparamos com uns amigos da Evy
(incluindo um ex-namoradinho dela. rs), da mesma cidade em que ela
mora (leia-se Suzano-SP), e que geralmente não costumam colar (com
frequência) ali na Liba.
A Evy
se surpreende por eles estarem ali, e eles se surpreendem quase não
reconhecendo a Evy,
pois não estão habituados a verem ela com maquiagem e roupa gótica. XD Além deles a Evy
e eu vemos outras amizades nossas, algumas dela, algumas minhas, e
outras tantas em comum. Do nada vem uma garota baixinha (e
nitidamente alterada), contente por me ver e já querendo me agarrar
e tal. Não faço a mínima ideia de quem seja. E antes dela grudar
em mim, uma amiga mais sóbria e sensata dela a agarra e a desvia de
mim. Pois ela sacou que a Evy
estava comigo e tal. ;-p A Evy
fica comigo pela segunda vez, e a gente se curti e beija muito mais
do que na primeira vez em que ficamos duas semanas atrás (sáb,
11/Ago/2018). :3
Já
de noite, a Evy
me leva pra um mercado próximo para comprar alguma coisa pra gente.
Na entrada do mercado vemos um senhor morador de rua com seu gat@
branc@ (?). A Evy compra
pra gente uma bandejinha com bolo de chocolate e dois achocolatados
na caixinha. Já pro senhor morador de rua, ela compra pães e um
pacote de açúcar que ele humildemente nos pediu. Com uma conversa
animada e intercalada com muitos beijos é a melhor maneira que a Evy
e eu encontramos de
curtir o nosso rolêzinho na Liba. * :-*
O
tempo passa rápido. E infelizmente chega a hora de ir embora. Noto
que a Evy
fica um pouco estranha... distante... pensativa... E sei que é por
causa dos seus amigos também de Suzano e que vão embora junto com
ela. Mas o real e exato motivo já não posso dizer qual é. Não
comento ou pergunto nada a respeito. Sei que ela deve ter os seus
motivos. E respeito isso. Sendo compreensível à minha maneira com
ela nesse momento em que identifico essa estranheza sutil partindo
dela. No metrô Sé, ainda dentro do trem, me despeço rapidamente da
Evy
e saio sozinho para a plataforma da estação, deixando pra trás ela e
os amigos. Não gosto muito disso. A despedida da primeira vez em que
fiquei com a Evy
tinha sido melhor… Não nego que após um dia maravilhoso junto da
Evy,
esses últimos acontecimentos me chatearam um pouco, além de me
preocupar muito com ela por não saber ao certo o porque exatamente
dela ter ficado diferente e tal. Mas foda-se! Não importa! Não será
isso ou qualquer coisa que irá estragar esse meu maravilhoso dia! O
meu dia junto da Evy!!!
♥
Desço no metrô Faria Lima. Pego
um busão pra Cotia. Faço amizade com um casal no busão. A conversa
é praticamente quase só sobre bandas pós-punks dos anos 80. rs.
Quase perco o último busão pra Ibiúna-Cityo. No busão noto que
perdi o meu fone de ouvido. ~T_T~ Isso me aborrece porque tenho a
intenção de ir embora ouvindo música/mp3 quando for ter de
caminhar solitariamente madrugada adentro. E principalmente porque
pretendia ouvir a mensagem de voz que a Evy
deixou gravada no meu celular (ela fez isso na
Liba enquanto me afastei
dela pra não estragar a surpresa de só saber como era quando
estivesse indo embora. rs. *^_^*). Desço em Furnas e encaro os 12 km
que tenho de percorrer a pé. Já no começo da madrugada de domingo
(26/Ago/2018), e após caminhar alguns quilômetros, pego uma carona
com a Fran
(Francieli Maciel)
e o seu namorido. A Fran
é uma amiga mais do que especial e que marcou profundamente a minha
vida devido há um acontecimento e experiência pessoal envolvendo a
gente em meados de 2008. Algo que não é agradável de se recordar,
mas que nos uniu/conectou e fez brotar uma amizade e respeito de
ambas as partes. Mas isso é uma outra e longa história... A Fran
e o seu namorido me
deixam na entrada do sítio onde moro, me poupando alguns
quilômetros/horas. rs. Agradeço ao universo pelo maravilhoso e
incrível dia que ele acabou de me proporcionar, cheio de conquistas,
vitórias e presentes. Pelas maravilhosas pessoas que conheci ou
revi. E por ter colocado a Evy
na minha vida. ♥
E
após um dia cheio de ganhos em todos os sentidos, chego a conclusão
de que os ciclos de amor/vida
& destruição/morte que regem o álbum ECOS
HUMANOS, não
são apenas algo ficcional, pois realmente estão presentes em tudo e
todos. Sempre estiveram, estão e estarão presentes em nossas vidas. Desde
o nosso nascimento, até a nossa morte. Ciclos da natureza e
mãe-terra que sempre existiram desde os primórdios e início de todo
o universo. Desde tempos imemoriais e ancestrais. Os ciclos de
amor/vida &
destruição/morte compõem o cosmos do qual todos fazemos parte e que não
há como se evitar...
*Julie
"Camila GLS Rock Zine" Albuquerque é quadrinhista e ativista underground
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